Marco Polo del Nero, José Maria Marin e Ricardo Teixeira – os três últimos presidentes da CBF
– montaram um esquema corrupto que arrecadou pelo menos R$ 120 milhões
em propinas. Investigações lideradas pelo FBI apontaram que eles
cobraram uma espécie de “pedágio” para cada empresa que procurava a
entidade com a meta de fechar acordos de transmissão ou de exploração de
marketing.
Ao Estado, fontes próximas à
investigação nos EUA indicaram que os valores manipulados pelos
brasileiros estão entre os maiores do escândalo que sacode o futebol
mundial. O que impressionou os investigadores do FBI é o caráter
sistemático das propinas cobradas. No documento emitido pelo
Departamento de Justiça, o envolvimento dos três cartolas é resumido em
uma frase: “Eles conspiraram de forma intencional para fraudar a CBF.”
Os investigadores revelam que o esquema criou uma
situação em que acordos comerciais mais vantajosos para o futebol
deixaram de ser assinados. A opção era sempre por empresas que
estivessem dispostas a pagar propinas. As vítimas, segundo o FBI, foram a
CBF e o futebol brasileiro, que poderiam ter arrecadado mais para
financiar clubes e torneios.
Foto: Michael Probst/AP
Investigação do FBI abalou a estrutura de corrupção montada por cartolas
Del Nero, Marin e Teixeira dividiram, por
exemplo, R$ 2 milhões por ano em propinas pagas pelo empresário José
Hawilla para as edições anuais da Copa do Brasil. Teixeira, ainda nos anos
90, também fechou um acordo com Hawilla para dividir o lucro que o
empresário teria obtido ao intermediar o acordo da Nike com a CBF
avaliado em US$ 160 milhões. Outros US$ 40 milhões foram para uma conta
na Suíça, divididos entre Hawilla e Teixeira. Uma parte significativa da
corrupção montada estava relacionada com a Copa América. A Datisa,
empresa que em 2013 comprou os direitos de transmissão e marketing até
2023 para o evento, concordou em pagar US$ 3 milhões por edição do
torneio ao presidente da CBF no momento do evento. Mas o valor da corrupção
pode ser ainda maior. Del Nero, por exemplo, compartilhou propinas com
Marin para pelo menos três edições da Copa Libertadores da América.
Teixeira ainda recebeu “milhões de dólares” para garantir a presença dos
melhores jogadores brasileiros nas edições da Copa América entre 2001 e
2011. Os valores não foram divulgados por enquanto. Na avaliação do FBI, o que
surpreende na investigação é o “caráter endêmico” da corrupção – e
também os métodos usados para tentar esconder o dinheiro. Foram usadas
malas repletas de dinheiro, notas frias, contratos fictícios,
chantagens, obras de arte, terrenos, contas em paraísos fiscais,
empresas de fachada, mansões, jatos privados e até dinheiro camuflado na
construção de piscinas. No meio da semana a
Justiça americana lançou a segunda etapa na operação contra a corrupção
no futebol. Um total de 24 dirigentes e empresários já foram indiciados,
e os americanos alertam que pelo menos mais 27 estarão na lista até
2016. O impacto na América Latina tem sido profundo, com a prisão,
afastamento e até fuga de presidentes de confederações e associações
nacionais. Brasil, Chile, Bolívia, Costa Rica, Honduras, Guatemala,
Venezuela e Colômbia foram sacudidas pela crise. Os americanos já
confiscaram US$ 100 milhões dos envolvidos, e as multas chegaram a US$
190 milhões. “Em 25 anos, a corrupção floresceu e se transformou em
endêmica”, disse o Departamento de Justiça dos EUA. De acordo com os americanos, não é apenas a
extensão geográfica que chama a atenção, mas também a maneira como o
dinheiro foi “contrabandeado” por fronteiras.
Jack Warner, ex-vice-presidente da Fifa, por exemplo,
chegou a usar dinheiro do Fundo de Desenvolvimento para o Futebol para
comprar uma mansão em Miami em 2005. Ele também mandou seu filho Daryan
em um avião até Paris para receber uma mala de dinheiro da campanha da
África do Sul para sediar a Copa de 2010.
Daryan nem dormiu em Paris. Horas depois de chegar à França, embarcou em um voo de retorno para Trinidad e Tobago.
Para pagar propinas para Teixeira e outros dirigentes,
J. Hawilla criou empresas de fachada em nome do brasileiro José
Margulies (conhecido como José Lázaro), e que serviam para receber e
pagar as propinas. Ele ainda usava o serviço de doleiros, “destruía com
regularidades provas de suas atividades e orientava dirigentes a não
usar contas em seus nomes para não chamar a atenção da Justiça”.
TABELA
Na Conmebol, as investigações também apontam profundos desvios de
verbas. O volume de propinas e o fato de ser generalizada chegou a
obrigar as empresas a criar tabelas de subornos, baseados na importância
de cada federação nacional dentro da Conmebol.
Se inicialmente apenas Argentina, Brasil e Uruguai
levavam dinheiro para permitir que contratos fossem assinados, o cenário
mudou depois que seis federações menores do continente se rebelaram em
2009. O motivo: também queriam sua parte na propina. Assim, quando a
empresa Datisa foi criada em 2013 para obter o contrato para a Copa
América até 2023, pagava por edição US$ 3 milhões para os “grandes” e
US$ 1 milhão para as federações menores.
Não faltaram nem mesmo tentativas de enganar as
autoridades americanas com justificativas absurdas. O uruguaio Eugenio
Figueredo alegou “demência” para não responder a perguntas do fisco
americano. Hoje, está preso em Zurique.
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